2/25/2013

Do valor dos livros

De todas as obras esta pareceu-me a mais indicada, dado o tema.


Quanto acham que vale um livro? Se para uns o valor é insignificante face àquilo que ele nos dá, para outros os cêntimos já contam na hora de comprar, e procuram sempre o negócio mais vantajoso. No cerne de tudo está esta noção individual da perceção do valor: de quanto dinheiro achamos que vale a pena despender para ter acesso (ou posse) de determinado livro.

Se é fácil percebermos que o valor é consumer driven ou, por outras palavras, ditado por cada um de nós de modo diferente, a verdade é que essa perceção é alterada globalmente por variados fatores externos: o local onde está à venda passando pelos serviços adicionais disponíveis, a utilidade que daremos ao livro, a confiança da marca e, muito especialmente, a nossa experiência em consumir outros produtos similares.

Recentemente temos falado (aqui, aqui e aqui) deste tema, em particular para refletir sobre a forma como variadas práticas comerciais (feiras de usados e venda permanente de saldos, ofertas variadas, etc.) tem vindo a baixar o valor percebido do livro ao ponto de, em alguns casos, o valor que estamos dispostos a pagar por ele já não compensar o trabalho que se tem em fazê-lo profissionalmente, com qualidade.

Para continuar esse tema trago aqui um outro exemplo que recentemente pude comparar. Quase todos se recordam do início da recente «moda» de venda de livros com jornais e news magazines (periódicos). Não sendo algo inovador, há dez anos houve um reatar e expandir da oferta que durante alguns anos multiplicou o fenómeno em Portugal. E somente nos últimos anos tem vindo a decrescer o negócio, mais por desinteresse dos agentes (as condições do negócio tornaram-se desinteressantes) do que outra coisa.

Ora vejamos: atualmente qualquer livro que saia com (por exemplo) a revista Sábado é, quase inevitavelmente, oferecido com a compra do jornal ou adquirido ao valor máximo de 1 euro. No entanto, quando há 10 anos o jornal Público iniciou uma coleção que iria ser um fenómeno espantoso de vendas as coisas eram diferentes. E os resultados foram extraordinários: 2 milhões de livros em 6 meses.

Na altura poucos consideraram um problema, e ninguém se referiu ao factor de multiplicação e desvalorização que um sucesso desses traria (de fenómeno provisório, passou a ser algo constante no mercado dos periódicos) e em como isso iria afetar cada vez mais o valor percebido dos livros.

Mas, que oferta maravilhosa era essa que causou tanto sucesso? Já poucos se recordam da «pechincha» que era comprar estes livros há dez anos atrás. Já quase ninguém se recorda do valor espantosamente baixo dos livros da coleção Mil Folhas: 4,20€ por volume, ao longo de 30 volumes. Com vendas médias superiores a 65.000 exemplares faturaram, só com os livros, bem mais de 250.000 € /título. Não se pode dizer que este tenha sido um mau negócio. Após quase 8.5 milhões de euros, era natural que este fosse um negócio a continuar e a copiar por todos os que se lhe seguissem.

Tanta foi a oferta que os preços caíram e, hoje, livro que fosse lançado com um jornal a 4,20€ seria um total fracasso por ser absurdamente caro (perguntem a qualquer responsável por produtos especiais ou aos departamentos de marketing dos jornais...).

O valor do livro caiu a pique arrastando o mercado. O que antes valia 8,5 milhões hoje nem 1 milhão vale e as receitas já nem dão para pagar o custo e o risco (cabe ao editor assumir a tiragem excessiva para cobrir os pontos de venda e ficar com todas as sobras).

Em semelhança, hoje não é quase possível vender-se um livro infantil ilustrado acima dos 9,00€ e é tão habitual a compra de pequenos álbuns abaixo dos 14,00€ que ninguém em Portugal se dá ao trabalho de os desenvolver, preferindo comprar as co-edições genéricas feitas na China ou na Índia ao preço da chuva. Num mercado de livros «fast food» não consegue sobreviver o trabalho editorial de qualidade e criatividade.

Tal como na música, todos desejam livros de borla, e pensam que o digital é a solução, que se os livros forem muito baratos, milhões irão ser vendidos, quando se esquecem que nem todos os livros são «fast-food», nem todos os livros são para milhões, e que são esses os livros que, se continuarmos a perder valor, irão desaparecer em Portugal.

Da próxima vez que se queixarem que o mercado só publica «porcaria» e que as livrarias só colocam à venda o «lixo», como repetidamente tem dito o António Guerreiro, do Expresso, lembrem-se que o mercado somos nós.

Nuno Seabra Lopes

18 comentários:

  1. Há uns anos, na sequência de um trabalho na Faculdade acabei, por iniciativa própria, por fazer um levantamento comparativo do preço do livro com o de outros bens desde finais do século XIX até quase aos nossos dias. Aquilo que verifiquei foi que, salvo nos períodos caóticos correspondentes às guerras mundiais, o preço dos livros manteve-se numa evolução natural e equilibrada e foi o preço dos cigarros, dos jornais ou do vinho (entre outros bens) que subiu.

    Nos últimos anos foi a loucura. A quebra do valor do livro é assustadora.

    Há uma história usada pelos grandes conferencistas de negócios como exemplo que sinceramente nunca percebi e que se adequa perfeitamente àquilo de que falamos aqui.

    Trata-se de um caso verdadeiro passado, creio, com a Colgate. Parece que essa marca começou há uns anos a perder compradores e consequentemente dinheiro. Acontece que um empregado de baixa hierarquia teve uma ideia que fez com que a Colgate voltasse aos números anteriores: aumentar ligeiramente o diâmetro do bocal do tubo. Os conferencistas de negócios acham sempre que este exemplo é brilhante, algo que me deixa confuso. O problema da Colgate não era o fazer dinheiro, era o estar a perder clientes. O futuro desta situação, na minha imaginação resulta num tubo de pasta de dentes acoplado a um terminal de grafonola ou tuba... Não se travou a perda gradual de clientes, encontrou-se uma solução de equilíbrio temporário.

    No começo deste blogue e sem termos combinado previamente, o João Carlos Alvim e eu falamos da responsabilidade socio-cultural de uma editora, falamos também da necessidade de um associativismo construtivo com efeitos de mercado - que o Rui Beja veio a abordar mais tarde. O problema aqui será sempre o mesmo de qualquer indústria cultural. Ou os editores se juntam e assumem o seu papel ou então estão a cavar a própria sepultura.

    No entanto nada disso será evitável enquanto quem gere muitas editoras não gosta de ler, não lê e não quer compreender quem o faz. Para esses, dizia a minha avó com muita razão "todo o burro come palha, a questão é saber-lha dar". E do mesmo modo todo o burro come ricas igualhas, também a aí a questão como lhas dar. Uma coisa é certa: dá menos trabalho dar palha, que é só ceifar que as igualhas que têm de ser cozinhadas e trabalhadas com esmero. Mas a palha não fideliza e as igualhas sim. A palha não traz novos animais ao estábulo e se se souber que há igualhas, a palavra pode espalhar-se...

    Tenho dito.

    ResponderEliminar
  2. Eu devo andar a ver mal porque abro o site da wook e vejo livros a 17€ e a 22€... O valor do livro continua alto! Estamos a falar de iniciativas raras essas da Sábado. Querem mesmo ver livros a preços exorbitantes para só os ricos comprarem? É que estamos a caminhar para isso (e eu não quero estar em Portugal quando a literatura for para os ricos, não quero mesmo).

    ResponderEliminar
  3. Cara Adeselna, os preços médios de mercado estão agora nos 13/14 €, claro que esses são preços standard normalmente aplicados à literatura dita mais comercial. O problema em Portugal para a área do livro foi sempre o da escala. Temos muito poucos leitores para os livros que produzimos. mas como dizer a uma empresa para produzir menos depois de ela ter aingido um determinado nível?

    Os livros que vê aos preços que indica são, quase de certeza, para livros de "alta" literatura. E aí nada há a fazer. Ainda assim repito o que disse no meu comentário anterior. Esses preços estão equilibrados com o preço dos livros em Portugal desde finais do s´culo XIX. Porquê? Porque para a "alta" literatura há muito pouco público.

    Façamos um exercício: Um livro de "Alta" literatura venderá hoje em média em Portugal não mais de 1200 exemplares mas para se vender essa quantidade dita a lei de mercado que é preciso existir uma tiragem de pelo menos 1750 para que ahaja uma gestão da exposição no mercado.

    ResponderEliminar
  4. Um editor tem de comprar os direitos de uma obra (um autor de prestígio não custa menos de 1250 a 1500 € em termos de avanço sobre os direitos - 8 a 10% sobre preço de capa para autor estrangeiro, 10 a 12% para autor nacional), a esse valor acresce possivelmente o custo da tradução (num livro de digamos 300 páginas raramente não menos de 2500 € pois para autores de prestígio são precisos bons tradutores, e ainda assim as traduções pagam-se mal entre nós), revisão (pelo menos 400 €), design (pelo menos 300 €), direito de imagem de capa (pelo menos 70 €), paginação (pelo menos 600 €). E com isto cobrimos os custos básicos da área editorial. Mas não nos podemos esquecer que o livro tem de ser impresso, essa impressão e acabamentos deverá custar não menos de 4000 €. Vamos então com 9120 €.

    Digamos que o livro era colocado à venda com um preço sem IVA de 15 €. Se se vendesse a edição toda (1750 exemplares) o resultado financeiro seria de 26250 e o lucro de 17130.

    Nada mau, pois não?

    Mas sabe que quando um editor coloca os livros nas livrarias tem de dar um desconto à livraria, esse desconto, em termos médios será sempre superior a 45 %, assim desse lucro, aquilo que o editor ganharia (vendendo toda a edição) seriam 9421,5 €. Com esse valor o editor teria de fazer novo livro e ainda pagar a estrutura da sua empresa (os ordenados, os impostos, as rendas, telefones, internet, electricidade, água, etc...).

    Não dá, pois não? E repare que isto é se se vendesse a edição toda quando o provável é que só se vendessem 1250 exemplares. E a isto não somei custos de publicidade, marketing comunicação.

    Quando temos pouco público para um produto há três soluções: a) deixa de se produzir o produto; b) aumenta-se o preço; c) tem-se a capacidade financeira para promover iniciativas que levem a um crescimento daquele tipo de público. A terceira, na nossa realidade de sempre é impossível sobretudo sem uma vontade política e oficial.

    Reitero contudo a ideia de que estes preços mais elevados para a "Alta" literatura sempre tiveram esta relação. Este tipo de livros sempre foi caro. As editoras que desafiaram este paradigma faliram.

    Agora se pensarmos esta economia do livro em função do que o Nuno Seabra Lopes escreveu acima, a situação é ainda mais grave pois nem a literatura dita "comercial" escapa uma vez que a lógica de mercado implica que para grandes vendas o número de exemplares exposotos aumente exponencialmente. Assim para se vender 25.000 exemplares teve de se imprimir quase 50.000 e gastar imenso dinheiro em publicidade. Se as editoras normalizam, como o estão a fazer, os preços destes livros em 14/15 € então é sinal que estão a cortar em algum lado: pagar menos aos autores, atrasar pagamentos aos tradutores e revisores até o livro fazer dinheiro suficiente no mercado, pagar miseravelmente a tradutores e revisores que mal conseguem viver com o que recebem. E nem preciso de chamar a atenção para que, quando um livro é "comercial" é uma mais-valia aquilo que se designa como vbalor apercebido, neste caso o volume do livro. Grande. E se assim é mais custosa foi a impressão e mais custosa a tradução.

    Complicado, não é?

    ResponderEliminar
  5. Obrigado pelo comentário, Adeselna.
    Num post anterior (http://edicaoexclusiva.blogspot.pt/2013/02/fast-happy-readers.html) eu referi-me a essa questão.
    Existe um problema na colocação de preço dos livros em Portugal que, quando associada à Lei do Preço Fixo, cria essa distorção que fala (mais por causa dos editores do que da Lei).
    De facto, as novidades de ficção (que são quem tem o destaque nas livrarias) acabam por ter um preço mais elevado - comparativamente a mercados mais alargados e competitivos como RU ou Espanha - e transmitir essa sensação de preço alto generalizado do mercado, em especial porque a Adeselna compara depois com os muitos livros que estão à venda a preços de saldo.

    Mas no mercado atual, com o grau de risco de publicação e política de elevada rotatividade comercial, a maior parte dos livros não se consegue pagar (e não seria por baixar o preço que iria alterar alguma coisa, bem pelo contrário - aquilo que se venderia a mais não compensaria minimamente a perda real de dinheiro).

    A verdade (e isso acontece com todas as coisas) é que se queremos qualidade, temos de a pagar, pois ninguém tem capacidade de dar o que tem de melhor para perder dinheiro - a casa, a alimentação dos filhos - só para dar «qualidade» às pessoas. O pior é que, muitas vezes - e como diz o Hugo Xavier - qualidade e preço alto não combinam, pois muitos dos produtos apresentados são caros e revelam baixa qualidade.

    Se nem todos os livros são «fast food», para toda a gente, feitos em escala e extremamente comerciais a verdade é que o canal de venda em peso trabalha como se estivesse num centro comercial e só quer vender fast food book.

    A qualidade não só é rara como muitas vezes não está presente nos canais (ou não fica muito tempo) e os preços praticados refletem o risco e, muitas vezes, o desespero e necessidade dos editores (avanços internacionais elevados, graves problemas de tesouraria, quase inexistência de concorrência através do preço).
    A perda de valor do livro é já demasiado elevada, baixando mais os preços de tudo iria resultar (mais rapidamente) no fim do livro menos comercial - e por vezes mais relevante e com mais qualidade.

    Talvez o digital possa ajudar em muita coisa (eliminando o risco de produção e alterando as regras do canal), mas um livro digital não é a mesma coisa, pois não?

    ResponderEliminar
  6. Como é que o digital pode ajudar se o valor apercebido para o digital é menor do que o do livro físico?

    Mais como é que pode ajudar se o livro é lançado num dia e no seguinte está pirateado pela net?

    A solução digital, neste momento não é solução, em termos editoriais será o tiro final no pé.

    ResponderEliminar
  7. dou-te razão, Hugo. O valor apercebido para o digital é, atualmente, quase nada (inclui-se no valor do portátil e o que pagamos à clix ou à Meo para termos internet e sermos capazes de «sacar» do Piratebay.se ou algo assim).

    Referia-me ao facto de só termos de nos dedicar (em termos de custos) ao que é verdadeiramente editorial: o desenvolvimento do produto, a criação de um protótipo e consequente ficheiro. Não tens riscos de distribuição, não tens tiragens e devoluções.
    Fazes, vendes ou não, não há mais nada.

    Conseguindo reduzir os custos a metade ou menos (sem produção) e anulando os riscos de distribuição e o stock, os níveis de riscos reduzem-se significativamente.

    Não significa que resulte, como é óbvio. Se piratearem e não vendermos nada, perdemos tudo.

    Falo também pela «revolução» que trará no canal de venda. É mais segmentado, mais direccionado, people to people. Consegues chegar com o produto certo ao cliente certo e não estares limitado às políticas dos grandes pontos de venda que só vendem 10% dos livros publicados e deixam ou outros a morrer no armazém.

    ResponderEliminar
  8. Sim mas neste momento nem isso compensa porque não há público entre nós que pague essa metade do investimento e porque os mecanismos de direitos de autor não estão ainda preparados para lidar com essas situações.

    Também não acredito na revolução do canal de venda porque, a acontecer o que acontece nos Estados Unidos, não irá valer de nada na confusão de milhões de novidades desde edições de autor a edições literariamente cuidadas.

    E eu até acho que o digital poderia ser o futuro mas não, nada da forma como está agora.

    ResponderEliminar
  9. Os livros que eu quero comprar não os compro, porque são caros de mais. Por muito que goste de ler, não consigo dar entre 17€ e 25€ por um livro. Recorro à biblioteca e às edições de outros países para conseguir ler coisas de interesse e a um preço acessível. Os últimos livros que tinha muita vontade de comprar custavam entre 20€ e 29€. Se é "alta" literatura ou não, não sei, sei que apesar de querer não o fiz.

    Talvez valesse a pena investir em criar público para os livros. Um investimento custoso (do ponto de vista monetário e de esforço) mas que traria benefícios de valor incalculável.

    Outra coisa boa seria apostar em livros com temas realmente interessantes e diversificados. Sempre que passo numa livraria só vejo "modas". Ali ao fundo uma banca cheia de livros sobre vampiros sexys, aqui uma banca cheia de livros sobre rainhas, etc... Já está provado que é preferível ter 10 sucedâneos que 3 sucedâneos e 7 livros com propostas diferentes? É que um leitor não tem anos de vida para ler os livros todos que já existem. Quando não encontra nada de diferente/bom nas livrarias, que puxe pelos seu lado consumista impulsivo aproveita para ir lendo uns "clássicos" mais baratos disponíveis gratuitamente.

    Quantos aos custos de um livro. Ao que me parece (pela discriminação dos preços), a editora faz tudo em out-sourcing ou pago à peça. Talvez se conseguisse alguma margem de manobra ao investir em trabalhadores contratados. Qualquer editora deveria ter um tradutor inglês-português residente, que se fosse formando ao longo dos anos e atingisse patamares elevados de qualidade. Assim como revisores e paginadores.

    Outra maneira de poupar dinheiro seria tentar criar tendências nacionais. Apostando-se em autores portugueses, poupa-se nas traduções e no pagamento de avanço sobre os direitos (que eu saiba, quase todos os não "altos" recebem consoante as vendas). Para além disso, com sorte e arte, consegue-se encontrar bons autores que talvez se possam exportar, gerando assim alguma entrada de dinheiro.

    Outro facto prende-se com a publicidade. Não sei que publicidade se anda a fazer, mas não me anda a chegar nenhuma que me faça comprar um livro. Talvez as estratégias tenham de ser repensadas.

    Mas isto são tudo especulações de quem está fora do negócio que serão, decerto, desviadas da realidade.

    ResponderEliminar
  10. Tenho curiosidade em saber se alguma editora fez um estudo de mercado para realmente o tentar perceber ou se tenta adivinhar tudo pelo volume de vendas.

    Falem com o criador da MusicBox acerca de pirataria. Ele terá muita coisa para ensinar aos editores. As pessoas não pirateiam só porque é mais barato, isso é um mito.

    Imaginemos que quero comprar um ebook. Tenho duas grandes plataformas em Portugal a Wook e a Kobo by FNAC.

    A kobo by fnac não permite pesquisar por língua. Ou seja, ou sabemos muito bem o livro que queremos ou somos obrigados a vasculhar no meio de livros em inglês. Será assim tão dificil meter uma opção para ir verificar na metadata do livro?
    Quando queremos pagar, ou temos de usar paypal ou temos de usar cartão de crédito, sendo que o último muita gente não tem. E a bela da transferência bancária? Claro que transferência bancária para a Kobo (que não é portuguesa) seria chato, mas é para isso que a FNAC serve, para ser o intermediário entre nós e a kobo, senão é só um logotipo a flutuar na página.
    Outro dos problemas é perceber como é que a FNAC não tem desconto de 10% nos ebooks e tem nos livros físicos. São opções comerciais que podem sair caras a partir do momento que qualquer outra plataforma o fizer.


    O Wook é bem pior. Embora os livros disponíveis estejam quase todos em português tem um sistema de bradar aos céus. Muitos dos livros que compramos, não é possível descarregar para a memória do computador pessoal. O livro fica no site, disponível para leitura usando software que só dá para instalar em tablets, impossibilitando os possuidores de e-readers (kindle, kobo, etc...) de ler esse mesmo livro nos seus dispositivos. O facto de não podermos instalar no PC é uma opção de muito má fé, uma vez que o cliente nem sequer tem direito ao ficheiro pelo qual pagou dinheiro. Estamos a pagar para ler um ficheiro que nunca estará do nosso lado da relação, que não podemos modificar nem converter, nem nada. Sem dizer que a wook não tem livros grátis. Se os tivessem podiam ir cativando os leitores até eles desejarem comprar outros livros mais recentes e "populares".

    Existe ainda a plataforma da Leya, que é, de longe, a melhor de todas, mas só tem livros da Leya e que aos poucos está a ficar contaminada com livros dos Escrytos.

    As editoras têm uma oportunidade de agarrarem o mercado digital antes que este lhe fuja das mãos, mas parece que preferem a abordagem de "um livro digital nunca será tão bom como um físico". Os discos de vinil também são superiores ao CD e MP3 e hoje em dia ainda se vendem.
    Claro que é preciso coragem, empreendedorismo e um grande planeamento. Tem-se aqui a oportunidade de se "fugir" aos 45% para o distribuidor/revendedor, assim como a política de vendas das grandes superfícies.
    O mercado digital é um comboio a arrancar e os editores estão a virar-lhe costas, tal como os produtores de música já o fizeram. Depois ninguém o controla nem consegue fazer parar. Agora é a altura de pular lá para dentro.

    ResponderEliminar
  11. Obrigado pelo comentário, caro Carlos.
    Muitas das coisas que fala são pertinentes (as soluções não são, porém, assim tão simples e muitas delas já foram testadas e falhadas). Aliás, várias editoras têm paginadores e revisores internos e os resultados em termos de qualidade não são necessariamente melhores, bem pelo contrário. Mas adiante, que o Hugo terá mais a responder-lhe do que eu, parece-me.

    Queria era perguntar-lhe pelo seu outro comentário que li no email, mas não vejo em lado nenhum para aprovar, sendo que achei que fez uma ótima análise e tem toda a pertinência e mais alguma. Até dava um post autónomo, que quiser reformular nesse sentido.

    ResponderEliminar
  12. Caro Carlos, ter tradutores e outros profissionais internos requer o pagamento da carga de impostos que hoje em dia em Portugal é brutal. Fica quase sempre mais barato em termos médios fazer em out-sourcing. E, convenhamos que é bastante complicado manter dívidas de meses a pessoas com quem nos cruzamos todos os dias.

    Essa solução que menciona só seria viável a grandes editoras que têm ritmo de produção suficiente para a justificarem mas é como digo, os encargos fiscais e sociais tornam-se um peso quase insustentável para a editora que opte por esse caminho.

    Quanto a criar público é óbvio que deveria ser a principal preocupação das editoras. Mas se estas estão descapitalizadas e, como referi, são geralmente dirigidas por pessoas que não lêem, nem percebem nada do público que lê como justificar essa necessidade a quem não percebe mais do que sondagens. Como justificar que os catálogos têm de ter oferta mais diversificada quando as ordens decorrem das estatísticas: "agora estão a vender-se vampiros sexies, temos de fazer disso também".

    Enfim, muito complexo. Não é bem lutar contra moinhos mas anda lá próximo.

    ResponderEliminar
  13. Caro Carlos, se o quiser transformar em post até o publico.

    ResponderEliminar
  14. Excelente tema, sobre o qual não quero deixar de dar a minha opinião, ainda que muito sumária face à amplitude e profundidade que o assunto merece. Atrevo-me mesmo a dizer que mais do que se justificaria a realização de um debate aprofundado, em sessão pública, com a participação dos profissionais do livro e de leitores interessados nesta temática.

    Concordo plenamente com as posições defendidas pelo Nuno e pelo Hugo, embora entenda as questões e perplexidades colocadas por Adeselna Davies e Carlos Silva que, vendo a questão de um prisma diferente, tiveram a louvável iniciativa de alargarem as perspectivas de discussão.

    No livro, como nos restantes domínios do negócio e da própria vida, o olhar superficial sobre os ganhos de curto prazo sobrepõe-se facilmente à análise cuidada das desastrosas implicações que o lucro fácil de hoje quase sempre acarreta para o futuro. O caso da venda/oferta com jornais, revistas e produtos similares, é paradigmático.

    O custo de produção do livro e a definição do respectivo preço de venda, é algo difícil de percepcionar pelos consumidores. Vários estudos de mercado a que tive acesso ao longo dos anos, demonstraram, invariavelmente, que os leitores consideram o livro caro, mesmo quando confrontados com situações visivelmente contraditórias face às restantes respostas, nomeadamente à comparação com livros de qualidade e dimensão notoriamente inferior. Já nem falo sobre o que dizer se compararmos o preço de livros de grande qualidade e dimensão com, por exemplo, o preço de revistas semanais.

    Há, como está dito nos comentários anteriores, um claro problema de práticas comerciais menos próprias e de insuficiente informação aos leitores. Não sou de opinião que preços elevados seja o problema do livro.

    ResponderEliminar
  15. Caro Carlos, em relação à sua análise das lojas de venda de ebooks em Portugal, não tenho nada a acrescentar, só a concordar com o seu ponto de vista.

    ResponderEliminar
  16. Caro Rui Beja, o pior é que esse é um problema que só muda com o exemplo. Todo o mercado está virado para a venda a curto prazo, para a alta rotatividade. Não temos grandes mercados secundários, nem canais especializados de relevo. Não temos canais abertos e a trabalhar segmentos mais pequenos, nem comunicação que trabalhe para eles. Até as grandes cadeias genéricas se transformaram em grandes livrarias especializadas em livros comerciais.
    Sair das categorias chave do mass market é começar um mercado de raiz, quase.
    Talvez pelo exemplo (de livreiros e/ ou editores estóicos que voltem a comprovar que há clientes para além da Fátima Lopes, se possa encarar melhor a situação.
    E compreendo o que diz o Hugo e o Rui Beja, mas não me parece que o entendimento corporativo da classe possa auxiliar minimamente nesse sentido.
    Com a crise já nem a lei é observada. Até a Porto Editora, que encabeçou o documento de reforço da aplicação da Lei do Preço Fixo, recentemente a quebrou com estrondo aquando do lançamento do livro do Jamie Oliver.

    ResponderEliminar
  17. No outro dia encontrei um livro que comprei antes de o Euro se ter instalado e que ainda tinha a etiqueta do preço colada na contracapa. O livro, de cerca de 300 páginas, custou 4200 escudos, portanto € 21 na moeda atual. Os preços mantiveram-se mais ou menos, ou baixaram, nos últimos 15 anos. Tendo em conta que tudo o resto aumentou, custos de produção, impostos, etc., se os preços baixarem ainda mais, as editoras têm de fechar. Os leitores muitas vezes esquecem-se de todo o trabalho que existe por trás de um livro - adiantamentos, direitos de autor, a tradução, a revisão, o design de capa, a paginação, a impressão, a distribuição e o livreiro. É muita gente para um único livro.
    Quanto aos e-books, enquanto o IVA dos livros eletrónicos continuar à taxa máxima de 23% na Europa, não será possível fixar preços verdadeiramente competitivos em relação à sua versão em papel, a não ser que sejam livros auto-editados.
    Há como que uma atitude de selva no mercado livreiro atualmente, tudo é válido para vender, por pressão dos números, resultante de um crescimento na oferta que em muito ultrapassa a procura. Antigamente eram os long-sellers que suportavam as editoras e que lhes permitiam publicar livros de maior qualidade literária para públicos mais exigentes. O lucro pelo lucro na edição não é compatível com o seu papel como produtor cultural e a aposta nos best-sellers pode revelar-se um desastre, porque é difícil prever se vão ser bem-sucedidos, e quando não o são, transformam-se em prejuízo difícil de reverter. Ou quando vendem muito durante algum tempo, e se a partir de certa altura deixam de vender, deixam mesmo de vender, já ninguém lhes pega. São raros os best-sellers que se convertem em long-sellers. E é muito difícil porque se um livro não vende no primeiro mês, é logo devolvido ou arrumado numa prateleira mais escondida, porque as livrarias não têm espaço para tanto livro, o que leva a uma rotatividade alta que acaba por «matar» a maior parte dos livros logo à partida, sem lhes dar tempo para conquistarem leitores. Todo o sistema está corrompido por uma lógica quase de supermercado.
    Existe uma Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, mas cujo papel parece só se destacar nas Feiras dos Livros, durante o resto do ano não vemos grande impacto na defesa e na consensualização dos interesses dos editores, dos livreiros e, claro, dos leitores.

    ResponderEliminar