Ao longo da minha experiência profissional em edição tornou-se evidente que o mercado do livro em Portugal — e não só — vive condicionado pela sua própria incapacidade de investimento.
Num setor onde o investimento por produto é baixo, os conteúdos tornam-se bens de consumo rápido: esgotam-se antes de revelarem todo o seu potencial e são substituídos a uma velocidade que reduz drasticamente o seu valor.
Entre os editores, a culpa é frequentemente atribuída a fatores externos: às redes de livrarias que exigem apenas “novidades”, ao reduzido tempo de exposição junto do público, ou ainda à imprensa que privilegia o que é jovem e recente. Tudo isto serve muitas vezes para afastar responsabilidades próprias. Como editor, não me interessa apontar erros alheios — ainda que existam — mas refletir sobre a forma como também nós, editores, alimentamos este ciclo vicioso.
É verdade que o mercado se molda assim, mas ele não surgiu por acaso, nem foi resultado de uma decisão estratégica repentina das livrarias. O mercado constrói-se a partir dos produtos que nele são colocados, e quando estes assentam maioritariamente em baixo risco e baixo investimento, todo o sistema se organiza em função dessa lógica.
Não defendo que as editoras se lancem cegamente em projetos disruptivos de elevado risco — a metáfora do “pássaro barato na mão” continua válida — mas também não é sustentável manter eternamente uma estratégia repetitiva, de baixo custo e sem espaço para uma verdadeira evolução. Muitas vezes nem sequer se aposta numa estratégia de inovação incremental, capaz de introduzir mudanças subtis, mas consistentes, que poderiam abrir novos caminhos.
A escolha de conteúdos tende a seguir fórmulas previsíveis: títulos com provas dadas no estrangeiro, temas da moda, nomes já conhecidos do público, ou autores com plataformas de comunicação consolidadas. Estes ciclos repetem-se há décadas, como tendências de moda que regressam, tal qual as calças à boca de sino.
Mesmo ao nível do produto, a lógica é idêntica. Se uma editora ousa inovar — quase sempre replicando algo já testado lá fora — rapidamente todos a seguem, reproduzindo a mesma fórmula. O problema é estrutural e falta em Portugal capacidade real para transformar os conteúdos de forma original e sustentada.
De tempos a tempos, surgem editoras, coleções ou autores, que introduzem uma lufada de ar fresco, obtendo até algum sucesso inicial. Mas sem uma estratégia sólida de continuidade, acabam por se deixar arrastar pelo movimento dos “seguidores”, que repetem até à exaustão aquilo que momentaneamente funcionou. O resultado é sempre o da saturação.
A ausência de uma estratégia de inovação é, talvez, a marca mais evidente da edição em Portugal. E ela traduz-se inevitavelmente num mercado de baixo valor e incapaz de competir. Porque nunca um setor sem investimento e sem inovação conseguiu resistir à mudança.
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