7/19/2013

RIP S.Cos. CCXIII


Dizem que o livro é para todos, mas só alguns fazem dele parte como o dia. Gente que ama, que cuida, que lê, que dá as mãos às capas, gente para quem o pensamento escrito tem a realidade das emoções tácitas, expressas no seio do casal.

Daí que não me venham com tretas e dizer que a Feira é a festa de celebração do livro. Tal como numa família, é no dia-a-dia que a festa se faz, que a relação se constrói; é nos altos e baixos, nas conversas e dúvidas, é no pó e na confusão do tempo que temos de gastar. No fundo, é na solidão e na conversa com as personagens, os amigos ou os livreiros que sentimos, de repente, que amamos os livros.

E é nas bibliotecas e nas livrarias que se celebram os livros, é aí que diariamente se comunga o sabor das páginas, as histórias que entretecem e enternecem os leitores; o resto são farturas, fanfarras, sol e passeatas por entre esta coisa gira que todos chamam Livro. No fundo, uma bela tarde de namoro de início de verão.

Daí que me enfurece que se mate uma familiar casa centenária de livros na Garrett, mesmo que outra nasça para aplacar; jovem e bendita em local impossível de amar, local de passagem, flirt de aeroporto, onde em 5 minutos se escolhe um livro que não seja pesado, que dê para despachar num voo de umas horas.

Bem sei que o tempo não está para as famílias, que quem ama não tem tempo para pagar a renda, mas é triste ver perder este mundo palpável que faz de nós humanos, para um tempo fugaz de coisas que nos perdem.

É triste saber que a loja que na Garrett surgirá não será criada durar 10 anos, quando mais 100. É triste saber que os lugares históricos viram só fachada: palácios com franchises dentro e música de elevador. Num mundo de aparência e ilusão nem o espaço da literatura salvam para dar consistência à vida.

Nuno Seabra Lopes

Sem comentários:

Enviar um comentário