1/28/2013

Os e-books e as livrarias do século XXI


Nunca como hoje se tornou tão premente repensar o livro, desde a forma como se edita, à forma como se distribui, ao formato, à plataforma, ao meio de chegar ao leitor. O advento da internet foi o rastilho, mas a invenção e o desenvolvimento de novas plataformas de leitura na primeira década do século XXI, como os leitores eletrónicos e os tablets, tornou mais do que inevitável essa questão.

É possível que dentro de uma ou duas gerações os livros deixem de existir na forma como os conhecemos hoje. O impacto que essa evolução terá no setor será sem dúvida alguma revolucionário. As editoras serão talvez as que menos sofrerão se forem capazes de se adaptarem às mudanças dos hábitos dos leitores, e de inovar, tanto na aquisição e tratamento de novos títulos, como na sua edição, como na sua distribuição, no marketing e na comunicação. As distribuidoras serão certamente as mais afetadas com o crescimento da venda de e-books. As livrarias, se não se adiantarem à inevitabilidade do fim, nos seus moldes tradicionais, também sofrerão um progressivo definhamento, como aconteceu primeiro com as lojas de música e depois com os videoclubes.

Contudo, isto não significa que as livrarias tenham de deixar de existir. Poderá haver margem para evoluírem também. Quem hoje aluga um filme diretamente a partir do televisor e que antigamente tinha de se deslocar a um estabelecimento comercial para o fazer, sente as vantagens de não ter de sair de casa para ver um filme, é certo. Porém, sentirá ao mesmo tempo um vazio, pois a ideia de ir a um videoclube e de não saber se o filme que se pretendia alugar estava de facto disponível, era de certa forma aliciante. Muitas vezes as cópias já haviam sido todas alugadas e o comerciante recomendava alternativas que nos levavam a descobrir outros filmes, quem sabe ainda mais interessantes do que aquele que se pretendia alugar inicialmente. São essas descobertas inesperadas que fazem da experiência de ir a um videoclube tão mais enriquecedora do que o aluguer através de um simples clique. É por isso que a existência das livrarias é fundamental.

A diferença entre o consumo de um filme e o de um livro é evidente – a compra de um livro passar por uma maior reflexão. Isto acontece não só devido ao preço, claro, mas também ao tempo que a leitura consome e ao investimento emocional necessário. O filme é de consumo mais impulsivo, mais imediato. Um livro fica por mais tempo.

Hoje em dia o leitor médio explora com maior cuidado as suas opções antes de decidir o que vai ler, procurando cruzar diferentes opiniões em sites dedicados à leitura. Muitas vezes o leitor prefere encomendar os livros logo através da internet ou fazer o download direto do e-book para o seu leitor eletrónico, no caso de ter um. Apesar disso, ainda há quem continue a não prescindir de uma visita a um estabelecimento comercial para adquirir os seus livros. Deste modo, quando o leitor se dirige a uma livraria, esperará naturalmente um serviço eficiente, que lhe permita sentir-se reconfortado com a sua compra, mas sobretudo levar algo mais consigo do que apenas o livro que adquiriu, como a experiência de manusear os livros, de observar as capas, de sentir o cheiro a papel e a tinta, de falar com o autor num lançamento, de conseguir um autógrafo ou mesmo uma dedicatória, de ouvir testemunhos de outros leitores. O manuseio de um livro encadernado é mais envolvente do que o de um CD ou de um DVD, pelo que talvez seja por isso que os e-books levarão tempo a tomar o mercado, talvez nunca o venham a tomar por completo. É como os discos de vinil que regressaram após quase se terem extinguido com o aparecimento do CD, e pareciam ter ficado para a história com a explosão do digital. A qualidade do som não se compara, dizem os amantes da música. É uma experiência sem dúvida diferente, tal como folhear um livro encadernado.

Todavia, o e-book veio para ficar, e em vez de se temê-lo, é essencial explorar todas as novas oportunidades que se podem desenvolver a partir dessa inevitabilidade para se repensar o futuro das livrarias. A dinâmica do espaço, a oferta de novos serviços e o atendimento prestado pelos livreiros serão essenciais. Só assim a livraria manter-se-á, não como um mero espaço de venda de livros, mas como um verdadeiro polo de encontro com a palavra escrita, impressa ou digital.

Catarina Araújo
Assessora de comunicação e escritora

5 comentários:

  1. Gostei imenso de ler este texto. E concordo com a frase: "É por isso que a existência das livrarias é fundamental." Excelente também a analogia com o videoclube! Continue a escrever. Abraço, Elisabete Miranda

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  2. Também acho que os ebooks não tomarão o mercado por completo. Mas não há dúvida de que irão dominá-lo. De resto, a apresentação de um livro em papel e a sessão de autógrafos com o autor continua a ser um grande acontecimento cultural e/ou social, que não desaparecerá tão depressa. Também as Feiras de Livros, que permitem o contacto com os escritores, continuam a atrair as massas.

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  3. Gostei bastante desta abordagem em relação às livrarias e aos livros impressos e tenho uma sugestão para os responsáveis pelas editoras e das livrarias. Sou uma pessoa que viaja bastante e por isso (também) tornou-se imprescindível a utilização de tablets e Ebook Readers para as leituras durante as viagens. É óbvio que levar numa mochila onde já se leva o portátil e inúmeras outras coisas, levar um calhamaço torna-se um pesadelo. Ou mesmo as bolsas dos bancos dos aviões não cabem livros grossos. Em resumo, é óbvio que os eBooks estão aqui para ficar mas, no meu caso, que já comprei dezenas de eBooks, acabei por comprar sempre a versão impressa. Ou seja, acabo por comprar duas vezes o mesmo livro. A Leya tem no site a hipótese de comprar a versão em papel e a versão eBook por um preço muito reduzido mas não gosto de comprar livros na internet, pelas razões apontadas neste artigo. Acho que se deveria criar uma espécie de produto que, para quem comprar a versão impressa, tenha direito a fazer donwload do eBook gratuitamente, mesmo que o conjunto tivesse algum acréscimo. Se assim fosse, ficava-se com o melhor dos dois mundos e as livrarias fariam parte da mudança.

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  4. Parece-me bastante interessante, a sugestão de Francisco Reto. A implementação não seria simples e implicaria investimento com algum significado. Mas julgo que vale a pena ser analisada e, eventualmente, ser feito um teste piloto.

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  5. Parabéns pelo texto que está muito bem escrito. Aliás, esta questão dos digitais: e-books, e-learnings, b-learnings (a Católica até já tem uma licenciatura em b-learnig, calculem e é de Filosofia) podia levar-nos muito longe...mas e que pode prever o futuro? Mas atenção, temos de estar alerta e tentar compreender os sinais ou, dito de outra maneira, não podemos estar agarrados ao passado, senão vejamos, o que aconteceu aos clubes de video? Hoje ninguém quer mais ter um negócio desses! e quanto aos livros que conhecemos, talvez o tempo que vivemos seja mesmo de transição para algo que ainda não sabemos bem mas não será certamente igual como o conhecemos em Maio de 2014.
    Filipe Matos

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