O PARAÍSO SEGUNDO LARS D.
João Tordo
Companhia das Letras/Penguin Random House, 15,90€
Editora: Clara Capitão;
Revisão: Ana Leonor Branco e
Cristina Correia
Capa: Maria João Lima (Panóplia) com fotografia de autor de
Vitorino Coragem
Produção: Printer
Desde a saída de Valter Hugo Mãe que a Companhia das
Letras (antiga Objectiva) procurava um escritor português que servisse de rosto
para o seu catálogo, tendo encontrado em João Tordo aquilo de que necessitava.
Transitado da Dom Quixote/LeYa, onde surgiu sob a tutela de Maria do Rosário
Pedreira, João Tordo mudou de casa numa altura em que a sua escrita também
mudava de registo. Mas deixarei isso para quem mais entende da matéria. O
principal a reter é a importância que a Companhia das Letras atribui a esta
faceta do seu catálogo, e como a mesma acaba por marcar o posicionamento que a
editora quer ter em Portugal.
Em termos de risco, João Tordo é um ativo seguro e gerador
de valor. Autor premiado com o José Saramago e com quase uma dezena de livros
editados, os últimos dos quais com bons resultados de vendas e de imprensa,
Tordo conta já com uma base alargada de leitores regulares e espaço garantido
nos escaparates de venda.
Em termos de conteúdos, este livro surge na sequência
do anterior (O Luto de Elias Grou),
algo revelado não só pelo autor logo no início do livro, mas também em termos
de comunicação, que o enquadra como segundo numa trilogia (de livros estanques
dentro do mesmo universo, e não de livros sequenciais). O discurso é de leitura
rápida mas profunda, com o discurso direto a controlar a velocidade da ação. Em
termos editoriais observa-se um cuidado na revisão, não se notando traços
profundos de editing.
Uma das características mais marcantes deste livro é a
necessidade que a edição tem de «dar corpo» ao livro. Com uma paginação
bastante arejada, corpo de texto e entrelinha de dimensão elevada, o livro procura
disfarçar ser um pequeno livro (em termos de dimensão) e apresenta-se como
grande. Mais propriamente, cresce até mais de 200 páginas para conseguir obter
esse efeito.
Em jeito de opinião, julgo que seria possível obter o
mesmo ou melhor efeito recorrendo a um papel com maior densidade/gramagem ou
índice de mão, aumentando com isso o valor percebido do livro e melhorando um
dos raros problemas encontrados nesta edição: a baixa opacidade nas páginas de
cortina a negro e nas fotografias. Um livro com a mesma lombada mas com 160
páginas e bons materiais seria uma opção mais interessante (e, porventura, não mais
cara...).
Em termos de design
o livro apresenta-se com muita elegância e boa leitura, com toques de design de miolo não raros, mas pouco
habituais. Como detalhe adicional, saliento a belíssima ideia de colocar um
marcador destacável por picote «enforcado» no plano (na sequência da badana).
Para além do marcador, o que mais se destaca é a fonte
utilizada no plano de capa: para a lombada, escolheu-se uma fonte de belíssima
leitura, recorrendo-se a uma typewriter
alargada na capa. Na contracapa surgem sem grande diferenciação uma sinopse
muito bem escrita seguida de um excerto da obra. Se ambos os conteúdos são bem
escolhidos, ressalva-se a diferença de fonte que se destaca excessivamente. Na
minha opinião seria possível anular a última frase da sinopse para aumentar o
corpo e igualar os registos, dando alguma indicação de que se trata em cada um
dos textos. A biografia assenta na figura literária do autor, mas talvez fosse
de referenciar outros livros de João Tordo (não publicados no Grupo), e a foto utilizada
é muito interessante, mas a impressão no perfil de cor em questão escurece-a
excessivamente.
Acima de tudo, nota-se um cuidado muito elevado com o
autor. Numa estratégia que não se percebe ser de coleção (João Tordo) ou
somente da trilogia, vemos que tudo se desenvolve em torno da imagem literária
do autor, num cuidado de elevação do seu perfil literário, com anulação de
elementos excessivamente comerciais. Isso denota respeito por João Tordo e
segurança na sua plataforma de fãs e vendas.
O preço parece indicado para o livro em questão e a
estratégia de comunicação (por relações públicas e imprensa em torno de autor)
é a que se coaduna com todo o restante marketing estruturado para esta obra.
Em resumo, uma obra de continuação da bibliografia de
João Tordo, onde está patente uma estratégia de elevação do autor à categoria
literária máxima em detrimento de uma estratégia comercial agressiva, bem
cuidada e trabalhada ao nível editorial, mas com detalhes menos conseguidos ao
nível da produção. Um livro pensado para fidelizar os leitores atuais de João
Tordo e fazer crescer o autor dentro da sua própria plataforma. Dada a idade e o
potencial do autor, parece-me ser uma estratégia acertada se bem que arriscada
no competitivo mercado atual.
Editorialmente recomendado, claro.
Nuno Seabra Lopes, editor e consultor editorial
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