6/14/2013

Livros que tomam partido: a edição política em Portugal, 1968-80

Fonte e espelho das grandes transformações sociopolíticas ocorridas no nosso país, a edição em Portugal ao longo do século XX é tema ainda pouco aprofundado por especialistas, académicos e investigadores, apesar da relevância que o seu estudo e divulgação deveriam merecer. Conforme refere Pedro Marques em texto publicado na revista LER de Outubro de 2012: “O século XX permanece estranhamente arredio da historiografia portuguesa do livro e da edição, como se fosse um objecto complexo demais para ser abordado doutra forma que não seja por estudos de parcelas temporais”.

É neste contexto que merece uma saudação muito especial a tese de doutoramento defendida no passado dia 7 de Junho, por Flamarion Maués Pelúcio Silva, no âmbito do Programa de História Social do Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo. O autor desenvolveu um trabalho de grande mérito, vivendo e convivendo em Portugal com cotados especialistas e experientes protagonistas, a que acresceu inúmeras entrevistas, intervenção em conferências, e a consulta extensa e intensa de documentação essencial para a compreensão, enquadramento e obtenção de conclusões válidas sobre a matéria que se propôs investigar.
A tese - Livros que tomam partido: a edição política em Portugal, 1968-80 - cuja divulgação e reprodução total ou parcial, por qualquer meio convencional ou electrónico, é permitida para fins de estudo e pesquisa desde que citada a fonte, é assim resumida pelo seu autor:

O objetivo deste trabalho é analisar a atuação das editoras de livros de caráter político em Portugal entre 1968 e 1980, a fim de verificar o papel político, cultural e ideológico que desempenharam no processo de transformações pelo qual passou o país nesse período. Para isso, busquei: a) identificar as editoras que realizaram essas publicações e examinar as vinculações políticas que tinham; b) realizar o recenseamento das obras de caráter político publicadas no período em estudo; c) identificar as pessoas e organizações responsáveis por essas editoras e publicações.

A partir dos dados levantados procuro entender como atuavam estes editores, quais suas motivações políticas, ideológicas e empresariais, como organizavam as editoras do ponto de vista intelectual e comercial, e qual o peso das vinculações políticas na vida das editoras.

Em termos cronológicos, o período em foco começa em 1968, com o afastamento por motivos de saúde de Salazar do poder e sua substituição por Marcelo Caetano, e vai até 1980, com a formação do primeiro governo de direita após o fim da ditadura em 25 de abril de 1974.

Uma síntese do trabalho mostra que existiram pelo menos 137 editoras que publicaram livros de caráter político em Portugal entre 1968 e 1980, tendo editado cerca de 4.600 títulos políticos no período. Este trabalho apresenta estudos sintéticos sobre 106 destas editoras.

Minha tese é que estas editoras conformaram o que podemos chamar de edição política no país. Ao realizar um trabalho editorial que vinculava de modo direto engajamento político e ação editorial, estas editoras – e seus editores – atuaram com clara intenção política de intervenção social, tornando-se sujeitos ativos no processo político português no período final da ditadura e nos primeiros anos de liberdade política.
Congratular Flamarion Silva e fazer votos para que o exemplo deste amigo brasileiro sirva de incentivo aos investigadores portugueses no domínio do livro e da leitura, constitui certamente a melhor forma de celebrar a importância desta sua obra para a historiografia da edição em Portugal.

1 comentário:

  1. Só temos que agradecer ao excelente trabalho e preocupação do «Flama» ao querer abordar uma parte importantíssima da edição portuguesa do período de revolução e transição democrática (que acabou por moldar a configuração editorial dos anos 90 e, de certa forma, a passagem para a fase de concentração).

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